quarta-feira, 15/05/2024

Lavagem de dinheiro: de onde vem a sujeira?

Procure conhecer as pessoas com quem você negocia. Apesar de o crime pressupor que a origem dos valores é ilícita, é desnecessária a existência de condenação pela infração penal antecedente

Na tentativa de tornar mais eficiente o combate ao crime de lavagem de dinheiro, a Lei nº 12.683/2012 operou importantes reformas na Lei nº 9.613/1998 (Lei de Lavagem de Dinheiro). Para tanto, foram incorporadas ao nosso ordenamento jurídico importantes recomendações internacionais acerca do tema.

Até julho de 2012, o artigo 1º da Lei nº 9.613/1998 estabelecia como crime a conduta de “ocultar ou dissimular a natureza, origem, localização, disposição, movimentação ou propriedade de bens, direitos ou valores” provenientes dos seguintes crimes: tráfico de drogas, terrorismo, tráfico de armas, extorsão mediante sequestro, contra a administração pública nacional ou estrangeira, contra o sistema financeiro nacional e praticado por organizações criminosas.

Após a sua alteração, o artigo deixou de especificar os crimes anteriores, bastando que os valores se originem de qualquer infração penal. Então, atualmente, qualquer crime ou contravenção penal é apto para tornar o dinheiro “sujo” e, portanto, “lavável”.

Evidentemente, o chamado branqueamento de capitais exige a ocorrência de uma infração penal anterior. A isso se dá o nome de delito acessório, uma vez que sua existência depende do crime ou contravenção antecedente.

A grande questão é: necessita-se que a existência da infração penal anterior tenha sido julgada? Em outras palavras, pode haver condenação pelo crime de lavagem de dinheiro mesmo quando não há qualquer condenação relacionada à infração precedente?

Por mais absurda que possa parecer, a resposta é sim. O inciso II do artigo 2º da Lei nº 9.613/1998 estabelece que o processo e julgamento do crime de lavagem de dinheiro “independem do processo e julgamento das infrações penais antecedentes”. No mesmo sentido, o § 2º do mesmo artigo exige que a denúncia seja “instruída com indícios suficientes da existência da infração penal antecedente”.

Simplificando: para o sujeito ser condenado por lavagem de dinheiro, basta que o julgador se convença da existência de provas suficientes da ocorrência da infração penal antecedente, tenha sido ela já processada/julgada ou não, seja a sua autoria conhecida ou desconhecida.

Daí fica a pergunta: de onde vem a “sujeira” dos valores? Ela pode ser proveniente da possível ocorrência de uma infração penal que sequer foi devidamente comprovada pelo juízo competente (que pode ser ou não o mesmo que julgará a lavagem de dinheiro).

Será necessário comprovar, também, a existência de dolo (intenção) do acusado de lavar dinheiro de origem ilícita. Ou seja, deve ser demonstrado que o sujeito tinha conhecimento de que os valores eram provenientes de infração penal. Por outro lado, não se exige que tal conhecimento seja específico, preciso ou amplo. Basta que tenha ciência da origem ilícita, ainda que desconheça qual tenha sido o crime e as suas circunstâncias.

Isso deve servir de alerta a todos que movimentam valores com terceiros e que têm dúvidas acerca da origem de tal dinheiro. É importante conhecer minimamente os parceiros de negócios, bem como se resguardar da origem dos valores transacionados. Ainda que não se tenha qualquer dolo, até provar que focinho de porco não é tomada, a vida já poderá estar na lama.

Thiago Costa dos Santos, mestre em Direito Constitucional, integra o escritório Demóstenes Torres Advogados, nas bancas de Compliance e Direito Penal Econômico.

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